No país, 40% dos pacientes esperam tratamento mais de 60 dias após diagnóstico, Ministério da Saúde admite falha e lentidão na implementação e diz investir em treinamento e expansão da rede. 

Em vigor há um ano e cinco meses, a lei que prevê o início do tratamento do câncer em até 60 dias após o diagnóstico no SUS ainda patina no país.
É o que mostra pesquisa com 54 secretarias estaduais de Saúde, hospitais e instituições que tratam câncer, de abril a junho. O trabalho foi encomendado pela Femama (Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama).

Até julho, 7.157 pacientes estavam inscritos no Siscan, sistema de registro que deve reunir o histórico do paciente e o seu tratamento. Isso representa pouco mais de 1% do total de casos novos de câncer (576 mil) registrados no país, segundo estimativas do Inca (Instituto Nacional do Câncer).
Dos pacientes inscritos, só 60% iniciaram o tratamento em até 60 dias após o diagnóstico, como diz a lei. Para os outros 40% foram mais de 60 ou até mais de 90 dias.

“A lei ainda está longe de funcionar de fato. Os pacientes continuam morrendo de cânceres evitáveis e curáveis porque demoram para ser tratados”, diz a médica mastologista Maira Caleffi, presidente voluntária da Femama. Do total de entrevistados nas instituições, 64% relatam que não houve repasse extra de recursos para que a lei dos 60 dias fosse implementada de forma eficiente. Metade deles também relata alguma falha de funcionamento no Siscan.

Até maio, o sistema funcionava em apenas 27% dos municípios brasileiros (1.546). Outro fator limitante é o fato de que só 34% das unidades básicas de saúde possuem acesso à internet, recurso fundamental para o registro e acompanhamento dos casos. Segundo Caleffi, existe outro gargalo ainda mais invisível: o acesso a especialistas e a exames que possibilitam o diagnóstico. “Temos de agilizar as consultas a especialistas. Biopsia é um grande gargalo. O paciente está fazendo xixi com sangue [indicativo de câncer na próstata] e não consegue fazer a biopsia”, afirma a médica.

Em São Paulo, o tempo médio de espera para consultas é de 205 dias, segundo dados da Secretaria Municipal de Saúde. Já a fila para exames é, em média, de 124 dias. 

Esse conjunto de entraves faz com que mais da metade dos casos de câncer no Brasil sejam diagnosticados em estágio avançado, diz Caleffi.
“Às vezes, quando o paciente chega, já não adianta mais. Cerca de 75% dos recursos públicos em câncer são investidos em quimioterapia. As fases iniciais da doença têm pouco investimento.”

“O grande problema hoje é quem não consegue acesso ao diagnóstico inicial. É um gargalo cego, não tem como mensurar”, afirma o oncologista Paulo Hoff, diretor do Icesp (Instituto do Câncer do Estado de São Paulo).

DEMORA

Após descobrir um nódulo no seio em março de 2013, a servidora Rosimeire de Almeida, 47, iniciou o tratamento apenas sete meses depois.
Nesse período, sem poder fazer todos os exames na cidade onde mora, foi transferida para Uberaba (MG). Lá, teve de esperar por uma nova consulta antes de fazer a biopsia –esta, só em agosto.

Com a demora, descobriu em novo exame que o câncer havia se espalhado para a outra mama. Meses depois, foi a vez da coluna. “Demorou muito. Tanto que deu metástase.”

O secretário de atenção à saúde do Ministério da Saúde, Fausto Pereira dos Santos, admite que há falhas e lentidão na implementação do Siscan. “As ações estão em andamento, mas reconhecemos que [o sistema] não está no estágio que gostaríamos”, diz. 

Para driblar dificuldades, a pasta afirma investir em treinamento e na expansão da internet nas unidades de saúde. Santos atribui a demora no acesso ao diagnóstico e tratamento a “vazios assistenciais” no país –regiões sem acesso a centros de quimioterapia e radioterapia e com baixo número de especialistas. “A lei precisa ser cumprida, mas se aplicou sobre uma realidade bastante heterogênea, em que há falta de estrutura em alguns locais.”

Em nota, o Ministério da Saúde diz que aumentou os recursos para oncologia em 37% no último ano em relação a 2010. Neste período, o número de quimioterapias e radioterapias cresceu 21%. Fonte: Folha de S. Paulo

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