Este tema, quando é debatido na sociedade em geral, levanta o esteriótipo de que as entidades médicas são “corporativistas” e de que defendem a “reserva de vagas” no mercado de trabalho. Mas, antes de qualquer julgamento, é importante levantarmos dados importantes para conhecimento da população, cujas informações poderão embasar melhor a avaliação do povo, que é a verdadeira beneficiária do “SUS”.
Atualmente, o Brasil possui 182 escolas médicas. A Índia, com uma população de 1,2 bilhão de pessoas – seis vezes maior que a brasileira – possui 272 cursos. De 2000 a 2010, foi autorizado no Brasil o funcionamento de 80 escolas de Medicina. Deste total, 72,5% são privadas, ou seja, visam lucro e cobram, em média, mensalidades de R$ 3 mil por aluno; em algumas a mensalidade chega a custar R$ 7 mil. Nisto tudo, o pior é a certeza de que o grande número dessas escolas médicas em atividade estão sem condições plenas de funcionamento: seja em termos de instalações, seja em inadequado corpo docente.
Segundo o CFM (Conselho Federal de Medicina), não faltam médicos no Brasil; entre 2000 e 2009, o número desses profissionais cresceu 27%, mais que o dobro do aumento populacional no período. O que ocorre é que o problema está nas diferenças regionais que são gritantes. O ideal seria contar com 2,5 médicos por mil habitantes. A média nacional (1,8) não está distante disso, mas em compensação temos o Maranhão (0,54), Amapá (0,72) e o Pará (0,75). Já São Paulo tem 2,48 e ganham destaques o Rio de Janeiro, com 3,47, e Distrito Federal, com 3,54.
Sem dúvida parte dessa desproporção constitui resultado inevitável da concentração do atendimento especializado em grandes centros urbanos. Mais da metade das 16.541 vagas em cursos de medicina do país estão no Sudeste. Os senhores acreditam que depois de formados esses médicos vão querer se embrenhar pelo interior do Brasil e sair da comodidade das cidades em que estão instalados? Vale até outra pergunta: se fosse você um destes profissionais, apostaria em lugares com vínculos empregatícios precários e instalações de trabalho sem a mínima estrutura?
O Conselho Federal de Medicina (CFM) e os Conselhos Regionais tomaram conhecimento recentemente de que a abertura de novas escolas médicas no país, compõe um suposto plano em desenvolvimento nos Ministérios da Saúde e da Educação. Mas “a abertura de escolas médicas para a solução de distribuição de atendimento médico no território nacional é uma atitude desprovida de senso prático. A multiplicação do número de escolas – que já dura décadas – não solucionou a povoação de médicos nos locais desassistidos”, como bem ressaltou o presidente do CFM, Roberto d’Ávila.
Mas o plano para atenuar o problema preparado pelos ministérios pretende oferecer aos profissionais recém-formados algumas vantagens nos exames de residência médica, caso se disponham a trabalhar dois anos em regiões desassistidas. O mecanismo viria na forma de um bônus, de 10% ou 20%, na pontuação do candidato. A proposta ainda precisa ser debatida por entidades médicas e não faltam vozes contrárias à estratégia, considerada coercitiva. Médicos inexperientes, argumenta-se, não seriam os mais indicados para tratar de populações carentes. Ainda segundo o colega Roberto d’Ávila, a falta de critérios compromete o atendimento ao deixar que usuários do SUS sejam atendidos por médicos inexperientes e oriundos de escolas, das quais suspeitamos, sem a devida qualidade, “criadas ao bel-prazer dos interesses políticos e econômicos”.
Para suscitar o debate no nosso Estado, explicitamos os dados. Contamos com quatro escolas médicas – uma federal, uma mista (publica-privada) e duas privadas (particular) e querem “forçar a barra” para abrir mais uma. Privada, é claro.
Nosso principal argumento da luta contra uma nova escola de medicina em nosso Estado reside na FORMAÇÃO do acadêmico. Quando ouvimos falar nesta insanidade, arrepiamos os cabelos. Em momento algum, no Tocantins, falou-se que esta nova escola irá construir um Hospital-Escola, pensam apenas em “desovar” seus alunos através de convênios hospitalares com Estado e município. Aí pensem, caros leitores, na qualidade, na experiência destes novos profissionais que atenderão os seus filhos, pais, familiares, enfim, os senhores.
Nobres “empresários”, aí vai a dica. Nos querem como entusiastas de novas escolas? É simples: criem um hospital de ensino em nosso Estado, já com vagas determinadas à residência médica nas especialidades básicas – clínica médica, cirurgia geral, pediatria e ginecologia e obstetrícia – que estaremos ao lado dos senhores e em defesa dos formandos. Contudo, se continuarem entupindo os hospitais regionais com alunos, nós poderemos, sim, estar “deformando” os acadêmicos e certamente estaremos em lados opostos, pois não comungamos com essa prática.
Nemésio Tomasella de Oliveira
Presidente do Conselho Regional de Medicina do Tocantins
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